Deve ser porque sou negro
(errou. tente aqui, agora)
Certa feita um indivíduo me chamou de homofóbico porque havia lhe dito que não gosto da maioria dos filmes do Almodóvar. Sei que ele se esforçou, foi fundo na busca dos fatos, cruzou todas as evidências possíveis - mas não deu. Foi impossível levar a sério um raciocínio brilhante desses. E foi a primeira vez que fui convidado a me retirar de um bar por não conseguir parar de rir.
Isso foi há muito tempo e sinto-me no dever de - ainda pela lógica claudicante daquele fulano - anunciar que fiquei um pouco mais "intolerante" desde domingo, após ver o Má Educação. E aqui vai mais um tijolo para o muro entre minha pessoa e esse bando de heterofóbicos: o único filme dele que acho 100% é o menos gay de todos que tive a oportunidade de ver - o Fale Com Ela.
Daí a insurgência dessa minha conclusão: fãs do diretor não gostaram do Má Educação por acharem-no o menos Almodóvar de todos. Discordo, em termos. Fale Com Ela é o que mais foge da grife. E Fale Com Ela é bom. Má Educação não. Se assim o fosse, talvez eu o apreciasse mais, certo? Temo que não.
Se isso me redime um pouco (e se estivesse minimamente preocupado com isso) saliento que não foi pelas cenas onde dois caboclos são mostrados aos chupões, beijos, abraços e afins. Afinal, convenhamos: já passei da época de me revoltar vendo isso. Não curti o filme pelo desenrolar do bereguedê, mesmo. Ficou a impressão que Almodóvar perdeu a mão ou nunca soube dirigir tramas policiais. Sabe criá-las, não conduzí-las. Que ele se debate longe de sua assinatura cômica quando ela não cabe numa determinada história e quando essa história carece de um brilho mais original (Fale Com Ela, de novo). E que o Gael Garcia Bernal fica irritantemente próximo ao Rodrigo Santoro interpretando um traveco.
E, falando nesse índio baixinho, não me furto em revelar minhas nobres intenções ao levar minha patroa para assistí-lo: desmitificar, desadonizar e deserotizar sua figura aos olhos dela. Mas, sei lá. Desconfio que até nisso o Almodóvar me decepcionou.
Certa vez um indivíduo me chamou de nazi porque uso cordões vermelhos nos coturnos. Pois é. Esse também fez o que pôde. Mas aí foi o Wagner no meu ombro direito que se descaralhou de tanto rir.
Primeira aula de retórica aplicada
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Olá, srs. extraterrestres.
Resolvi dar um pulo nessa tranqueira porque algo me ocorreu domingo passado, enquanto assistia Os Esquecidos:
Sempre tive uma queda endêmica pelo inacreditável, em preferir as versões mais fantasiosas em detrimento às objetivas e racionais (navalha de occam? tsá...) e em aplaudir as mentiras mais elaboradas.
Por isso nutro uma simpatia pelos abduzidos. Porque provavelmente não exista nada acerca da sua existência/inexistência que me interesse mais que os relatos absurdos dessas supostas vítimas que vocês fazem questão de espalhar pelo nosso mundinho.
Neguinho com implante na cabeça, lapsos de tempo e memória, cicatrizes, testemunhos emocionados de visões das mais diversas, etc. Tudo isso carrega um potencial romântico irresistível para um consumidor de ficção científica do meu tamanho.
Mas me respondam: por que os zé-manés? Qual o motivo de vocês só escolherem os zé-roelas para um passeiozinho pela galáxia? Quer dizer, posso até compreender que isso sirva aos seus interesses - já que a potencial inconfiabilidade na história de um indivíduo desses serviria para mantê-los na moita - mas...
Vejam bem: se eu fosse um alien poderoso o suficiente para vencer distâncias estonteantes (seja isso um erro nosso de raciocínio ou similar) e que mantivesse o canhão de prótons permanentemente escovado e apontado em direção a esse planetinha, posso lhes garantir que estaria pouco me fodendo para a boataria a meu respeito.
Analisem o caso da Mae West. No auge de seu furor uterino e ao contrário da maioria de suas contemporâneas, ela fazia questão de trepar com qualquer um que cruzasse seu caminho. Sua lógica era indevassável: se um encanador chegasse para sua roda de amigos e dissesse "comi a Mae West" ele seria prontamente desacreditado. E um ilibado, respeitável e prestigiado juiz jamais o faria temendo basicamente o mesmo, porém pelo inverso. Ou seja: apesar de toda sua voracidade, ela era virtualmente intrepável.
Acredito que o "Paradoxo de Mae West" poderia muito bem ser aplicado nalguma figurinha pública dessas, portanto. Cuja credibilidade aos olhos do cidadão médio ainda estivesse livre de arranhões na lataria, claro. O Jô Soares, por exemplo. Seria interessante ver como esse sujeito insuportável, tracionado pela sua notória incapacidade de calar a boca, reagiria à monumental vontade de relatar ao mundo seu contato imediato do terceiro grau. E, por extensão, observar a reação de seu tão adestrado público.
O que teríamos, a partir daí? Um progressivo mal-estar em sua rede de relacionamentos, irradiada de fora para dentro, até o (para mim) saudável e inevitável ostracismo? Ou a exceção do paradoxo: impelido pela estrondosa manifestação favorável de seus acólitos e embevecido pelas luzes de matizes jamais vistas nesse mundo... Jô Soares monta uma igreja da nova era.
Foi só uma idéia. Na verdade, eu queria dizer o seguinte: como acredito que vocês continuarão abduzindo apenas nós, os populares, peço: caso meu nome esteja aí como próximo na lista, utilizem um método de sucção diferente do mostrado n'Os Esquecidos. Aquilo deve doer pacas.
I'm the Walrus
(errou. tente aqui, agora)
Ei-me.
Um bom tempo longe do computador transformou-me na prova viva de sua benesse. Meus dedos voltaram ao formato original, meus caninos decresceram e as barbatanas em minhas costas não existem mais. Também sequer sou acometido pelos meus antigos surtos ao ler no subject dos e-mails "encomenda de cliente" ou, ao abrí-los: "Oi, Aitel! Será que dava pra você ver se existe um filme chamado A Borboleta Transparente no Queixo de Buda? Meu cliente jura que viu na loja aqui do lado. Abraços!"
Mas tive o bom senso de voltar antes de comprar aquela chácara em São Sebastião da Óstia. Sorry, fellas (da puta). A criação de galinhas vai ficar pra depois. Por ora, sou facilmente encontrável dentro de uma determinada loja dentro de um específico shopping de Curitiba, onde agora sou um simples, prosaico e quase invisível vendedor de CDs e DVDs. Sim. Agora faço parte do problema. E que Tom Waits se apiede da alma daquele que ficou em meu lugar, tentando resolvê-los: tenho uma lista de 120 títulos estapafúrdios de filmes prontinha para ser enviada aos seus cuidados. E o gosto é doce.
***
Um homem não pode chegar ao fim de sua vida sem ter tido a experiência de perseguir duas coisas:
* um coelho desesperado, numa estrada empoeirada, à noite, a bordo de um Volvo NH de oitenta toneladas.
* o sentido da existência dessa palhaçada toda aê.
Portanto, em breve revelarei ao mundo as reais implicações do surgimento do cubo mágico na sociedade moderna. Aguardai, pois.